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Quando a ciência e a tecnologia não estão de acordo sobre um nascimento saudável.

Se olhar para a literatura científica, encontrará repetidamente conclusões sobre o facto de que muitas intervenções aumentam o risco para a mãe e bebé em vez de o diminuir.

Quando se fala de uma mulher que escolhe como profissional de saúde uma parteira e não um obstetra para a acompanhar durante a sua gravidez e assistir ao nascimento do seu bebé, o publico no geral irá pensar numa mulher que usa longas saias de algodão, tranças nos seus cabelos, come apenas comida orgânica, vegan, faz ioga, e talvez conduza uma VW “pão de forma”. O que o publico não sabe é que essa mesma mulher tão hippie, tão alternativa como imaginam é apenas uma mulher “super geek “que se muniu de todas as ferramentas que a ciência e a investigação de hoje em dia lhe deram para proteger a sua saúde e do seu bebé.

Quando digo a amigos próximos que escolhi ser acompanhada por midwives nesta minha terceira gravidez em vez de continuar com a assistência do meu obstetra de sempre, há sempre uma surpresa, há sempre um “porquê?!”. Embora tenha tido uma experiência pessoal absolutamente fantástica com o meu obstetra – sou a cliente ideal, basta levar o jornal na hora do nascimento, folhear que eu faço todo o trabalho…- escolhi nesta gestação ser acompanhada por midwives e deixar de lado todo o aparato de obstetrícia que nunca tive de requerer nas gravidezes e nascimentos anteriores. Sendo uma grávida de baixo risco, para quê escolher um profissional que é treinado para casos graves, alto risco e complicações?!

*Nem todos os países tem esta escolha de modelos de acompanhamento a gravidez e nascimento.

Nos dias de hoje, no mundo “civilizado” dos países de 1º mundo como UK, USA, Austrália e grande parte da Europa, a maioria da população confunde ciência com tecnologia.

Pensa-se que o que significa ser um médico científico e actualizado é usar a máxima quantidade de tecnologia em qualquer paciente. E isso torna-os perigosos.

Na verdade, se olhar para a literatura científica, encontrará repetidamente conclusões sobre o facto de que muitas intervenções aumentam o risco para a mãe e bebé em vez de o diminuir.

Mas a maioria das futuras mães não parecem saber disso, mesmo que os obstetras o saibam. Paradoxalmente, essas mulheres parecem querer o mesmo que eu quero: um resultado seguro para mãe e filho. Mas ninguém parece dizer-lhes qual a melhor maneira de obter este resultado baseando-se no que os dados científicos traduzem.

O amigo que se atreve a oferecer meio copo de vinho a uma grávida é considerado culpado de pôr a mãe e bebé em perigo, de ser imprudente, enquanto o obstetra que oferece procedimentos desnecessários e arriscados é considerado heróico. (De modo algum uma grávida deve beber álcool! Foi só um exemplo…)

Especialistas em ética falam sobre escolhas de nascimento como se fossem sempre informadas e autónomas, mas na verdade quantas mulheres afirmam que "escolheram", por exemplo, medicação para o alívio da dor durante o parto, mesmo que nunca lhe tenham sido transmitidos os riscos?

Enquanto grávida pela primeira vez, em 2012, entrámos numa corrida contra o tempo para nos prepararmos para o nascimento do nosso filho. Descobrimos hypnobirthing que nos deu ferramentas fantásticas e consultámos literatura médica científica para descobrir como maximizar a segurança para mim e para nosso bebé.

Isto foi o que aprendemos com os estudos disponíveis:

  • Deveria manter-me activa, andar muito durante a gravidez e também manter-me móvel durante o meu trabalho de parto - isso diminuiria o tempo de trabalho de parto e seria um bom método de alívio de dor.

  • Durante a gravidez, eu deveria fazer exames regulares ao meu peso, urina, pressão arterial e crescimento da barriga, mas deveria evitar exames vaginais.

  • Não me deveria incomodar com ecografias durante o período pré-natal se minha gravidez continuasse a ser de baixo risco, pois seria extremamente improvável que melhorasse a saúde do meu bebé e poderiam resultar em testes adicionais que aumentariam o nosso risco sem benefícios.

  • De acordo com os melhores estudos disponíveis, perto do nascimento, já no final da minha gravidez de baixo risco, não deveria requer indução, nem episiotomia, nem monitoramento contínuo dos batimentos cardíacos do bebé durante o parto, nem medicamentos para dor, optar por clampeamento de cordão tardio, e definitivamente não optar por cesariana electiva.

  • Eu deveria dar à luz na posição de agachamento, e eu deveria ter uma doula - uma pessoa profissional de apoio a gravidez e ao parto para falar comigo durante todo o processo de nascimento.

Em outras palavras, se os testes regulares de baixa tecnologia continuassem a indicar que eu estava a ter uma gravidez medicamente desinteressante, e se eu quisesse maximizar cientificamente a nossa segurança, eu deveria dar à luz como as minhas bisavós: com a atenção de uma ou duas mulheres experientes em trabalho de parto e nascimento, que apenas esperariam e me observariam, enquanto eu fazia todo o trabalho (chamamos trabalho de parto por um motivo.) A única diferença notável entre o meu nascimento e o das minhas bisavós era que minha parteira usaria intermitentemente um monitor de batimentos cardíacos fetais - apenas de vez em quando - para garantir que o bebé estava bem.

Não tive grandes problemas em transmitir estas opções ao meu obstetra, que concordou e apoiou as nossas decisões mas senti que foi uma decisão de puro comodismo – porque já tinha começado uma relação de amizade com ele (acompanhou-me durante as minhas duas gravidezes anteriores) e sentia-me confortável e segura com a sua presença e isso foi extremamente importante para mim – mas senti que foi um desperdício do seu tempo (muito bem pago por sinal) como especialista em gravidez de risco e em intervenções com uma gravidez de tão baixo risco e durante partos sem qualquer intervenção.

A grande maioria dos obstetras deixariam claro que estariam bastante desconfortáveis ​​com esse tipo de nascimento "antiquado". Se assim fosse o nosso caso teríamos escolhido outro profissional de saúde.

Dois dias após o nascimento do meu filho, uma das minhas amigas deu a luz o seu bebé, e tendo feito a preparação hypnobirthing com ela e tendo partilhado toda a informação que íamos descobrindo durante gravidez, estava bastante ansiosa para saber como tudo tinha corrido com ela. Tudo correu bem mas acabou por consentir uma intervenção tecnológica: havia presença de mecónio quando as membranas se romperam (isto significa que o bebé teria defecado no útero) e os pediatras levaram o bebé para aspirar a sua traqueia. A ideia era prevenir a pneumonia.

Três meses depois, num encontro pela manhã, descobrimos que havia resultados de um ensaio de controlo randomizado que acabava de sair. Mostrava que os bebés nascidos na presença de mecónio, que só tinham tido a boca limpa e não as suas traqueias aspiradas apresentavam taxas de pneumonia menores em comparação com aqueles que receberam a intervenção traqueal. Mais uma intervenção que não parecia valer a pena.


Para mais informações sobre uma preparação para o nascimento com hypnobirthing,

consulte a nossa pagina Hypnobubs online

Então, porque com tantos novos estudos e ensaios a saírem todos os anos, quando a evidência ainda apoia um tipo de gravidez e uma gestão de parto pouco intervencionista para casos de baixo risco, ainda não se fez praticamente nada para tornar o nascimento mais científico e menos tecnológico?

Outra questão que surge é a falta se seguimento das recomendações da OMS sobre gravidez e parto pelos profissionais e Instituições de saúde. Qual o motivo das rotinas e protocolos hospitalares serem tão diferentes entre profissionais de saúde, clinicas, maternidades, hospitais e mesmo Ministérios da Saúde um pouco por todo o mundo?

Não somos todas iguais? O processo fisiológico da gravidez e nascimento não é biologicamente igual para todas as mulheres, com uma gravidez de baixo risco?

Hummm …

Pesquisei esta questão e encontrei a opinião de Libby Bogdan-Lovis, do Centro de Ética e Ciências Humanas nas Ciências da Vida da Universidade Estadual de Michigan, que também é Doula. Libby observou que uma grande parte do problema é a forma como o nascimento é concebido no Ocidente - como "perigoso, arriscado e necessitado de controlo para garantir um bom resultado".

Libby apontou que as restrições institucionais contribuem para o problema: "As companhias de seguros geralmente cobrem o nascimento hospitalar, não o nascimento em casa, eles estão mais inclinados a compensar os médicos sobre as parteiras, eles preferem compensar os médicos e as parteiras hospitalares por fazer algo do que por não fazer nada, e a abordagem de gestão de risco do sistema de saúde apoia aqueles que podem demonstrar que fizeram todo o possível em termos de intervenção, mesmo sabendo que as tentativas de controlo do nascimento estão repletas de reais riscos médicos e geralmente levam a cascatas de intervenções".

Raymond De Vries , sociólogo do Centro de Bioética e Ciências Sociais da Universidade de Michigan, comparou os nascimentos nos EUA com os Países Baixos, onde é professor convidado da Universidade de Maastricht. Ele relata que, nos EUA, "os obstetras são médicos especialistas e os especialistas vêm o nascimento como perigoso e assustador". De Vries sugere que a organização dos cuidados de maternidade neste país constitui realmente um problema ético, embora normalmente não o reconheçamos como um. Eticistas médicos "preferem olhar para os problemas [comparativamente raros] de fertilização in vitro e diagnóstico genético pré-implantação do que para os problemas diários de como organizamos o nascimento aqui nos EUA; eles preferem falar sobre preservar as "escolhas" das mulheres do que explorar como essas escolhas são manipuladas pela cultura ".

Tão verdade. Os éticos gostam de falar sobre as escolhas de nascimento das mulheres como se fossem informadas e autónomas, mas já perdi a conta de quantas mulheres me disseram que "escolheram" medicação para dor durante o nascimento, embora nunca lhes tenham sido explicados os riscos de medicação para dor. Nunca houve alguém que expressasse confiança nelas que pudessem fazer nascer os seus bebés sem medicação, e nunca tiveram uma doula para andar e conversar sobre a dor. Que tipo de "escolha" é esta? Não vejo onde está a escolha…

Como Libby Bogdan-Lovis disse: "A mulher dos dias de hoje têm a noção de que um nascimento não medicado é o equivalente a sugerir que as mulheres devem abraçar ansiosamente a tortura".

Eu penso em todas as escolhas que fiz, e que continuo a fazer, e o que mais chocou os meus amigos e familiares foi optar pelo numero mínimo de ecografias durante a gravidez (aqui na Austrália são duas. 12s e 18s). Nesta terceira gravidez nem a ecografia das 12 semanas fiz, pois tinha realizado um teste de NIPT que tinha tido resultados de baixo risco. A ecografia das 12 semanas não iria adicionar nada ao resultado obtido anteriormente.

Um estudo dos EUA - envolvendo mais de 15.000 gestações - publicado no New England Journal of Medicine mostrou que os exames de rotina não deixavam os bebés mais seguros. Esse trabalho foi liderado por Bernard Ewigman , agora presidente de medicina familiar na Universidade de Chicago e NorthShore University Health System.

Dr. Ewigman dá-nos uma possível causa de porque tantas gravidezes de baixo risco agora envolvem exames de rotina. Ele sugere que é em parte apenas movido por questões emocionais e não tem nada a ver com a saúde da mãe ou bebé - as pessoas gostam de "ver" os seus bebés - e em parte devido à crença não fundamentada de que saber mais vai necessariamente levar a melhores resultados. Ele concorda que as ecografias pré-natais de rotina em gravidezes de baixo risco (ou seja, gravidezes em que não houve problemas) não parecem ser apoiadas pela ciência, se o resultado que está a procura é a redução da doença e a morte nas mães e crianças.

Relativamente a uma mãe que escolhe o mínimo de exames de “rotina” e que segue o percurso das “bisavós” – tal como eu escolhi - Dr. Ewigman afirma: "Esta abordagem é racional e bem informada. Mas a maioria das tomadas de decisão quando se trata de problemas médicos envolvendo uma mulher grávida ou bebé não são bem informadas e não são baseadas no pensamento racional". Ele acrescenta: "Estamos todos muito interessados ​​em ter bebés saudáveis ​​e é bastante fácil fazer o tipo de erros cognitivos que as pessoas fazem quando há uma carga emocional e atribuir benefícios tecnológicos que não existem. Ao mesmo tempo, quando há problemas numa gravidez, essa mesma tecnologia pode salvar vidas. É fácil fazer o salto [problemático mental] que a tecnologia sempre será necessária para um bom resultado ".

O Dr. Ewigman descreve também como algumas pessoas obtêm falsas certezas das ecografias pré-natais, pensando que se os clínicos não vêm nada fora do normal, o bebé nascerá perfeitamente saudável. Wrong… Essa foi uma das razões pelas quais estive tão tranquila com a minha escolha. Eu sabia pela minha própria pesquisa sobre anomalias de nascimento com que frequência as ecografias se enganam: imensa! Ao observar a nossa cultura ele afirma "é um verdadeiro fascínio pela tecnologia, e também temos um forte desejo de negar a morte." E os aspectos tecnológicos da medicina realmente funcionam bem neste tipo de cultura”.

Eu não sou contra tecnologia, muito pelo contrario, e muito menos contra fazer escolhas durante o processo de gravidez e nascimento. O que tranquiliza uma mãe não tranquiliza outra, mas há que ter em conta a veracidade dos resultados, riscos e benefícios de toda a tecnologia inerente a exames tão rotineiros como os que acontecem todos os dias, em gravidezes de baixo risco, simplesmente por rotina ou porque se tem a noção errada de que quanto mais exames se fazem, mais seguro será o nascimento e mais saudável será o bebé.

O que gostaria muito era que as mulheres tivessem em posse da verdade sobre o nascimento - a verdade sobre os seus corpos, as suas habilidades e os perigos da tecnologia. Sim, salvam vidas e vivemos na melhor altura para termos os nossos filhos. A ciência e a medicina fazem milagres! Mas da próxima vez que vos sejam sugeridos estes ou aqueles exames perguntem-se “porquê”, “para quê”, “riscos”, “benefícios” e o resultado irá trazer-me um bebé, uma gravidez ou um nascimento mais saudável?

Rotinas só por rotina tem muito que se diga, começando por nem todos os profissionais de saúde, maternidades, clinicas, hospitais, organizações e ate organizações governamentais (ministérios etc) não seguirem todos as mesmas rotinas.

Se não seguem todos as mesmas rotinas, será que são mesmo necessárias?

Se partirmos do principio ético “first do no harm” – nunca prejudicar – vamos acreditar que estes profissionais e instituições não iriam pôr a saúde da mãe e bebé em risco. Então porque há rotinas e protocolos tão diferentes?

Porque sim, por hábito, por falta de informação, por falta de formação, por excesso de zelo (já falamos que excesso de tecnologia não implica melhores resultados no nascimento ou saúde da mãe e bebé), por acordos financeiros (ui isto agora dava pano para mangas...seguros…)

Gostaria que pensassem melhor no que é normal durante as vossas consultas de acompanhamento da gravidez e pré parto e que questionem essas rotinas. Talvez tenham algumas surpresas. O normal nem sempre é o correcto.

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